Entrevista traduzida: Tim Schafer

Entrevista traduzida: Tim Schafer

Saudações aos leitores.

Trago-lhes hoje uma uma variação dos já tradicionais artigos traduzidos, dessa vez uma entrevista traduzida, que Tim Schafer, autor de clássicos com Day of the Tentacle e Grim Fandango, concedeu ao jornal francês Le Monde. O game designer falou sobre seus jogos clássicos e também abordou alguma questões referentes ao momento atual da indústria dos jogos. Confiram abaixo:

“Sempre terá gente que quer video games com um roteiro estudado”

Tim Schafer é o fundador do estúdio DoubleFine e co-criado de vários jogos dentre os mais marcantes dos anos 1990, como Grim Fandango e Day of the Tentacle, cujas versões remasterizadas foram lançadas esse ano. Eles respondeu as questões do Monde.fr antes de sua conferência em Paris no dia 2 de maio, organizado pela revista Jeux vidéo na Cité des sciences.

O sucesso de Day of the Tentacle é notadamente devido a seu humor. Vinte anos depois, o jogo continua tão engraçado quanto era em seu lançamento. Há uma receita para criar jogos que continuam engraçados?

Day of the Tentacle é um jogo um pouco especial, notadamente porque há alguma coisa de verdadeiramente inocente. Seu humor não é agressivo, é bem comportado. Talvez ele tenha envelhecido bem porque nós tentamos recriar um universo que já era bastante “vintage” à época, rendendo homenagem aos desenhos animados de Chuck Jones que nós adorávamos quando nós éramos crianças (Pernalonga, Tom & Jerry…). Pode ser esse o segredo.

Também é um jogo bem grande, sem elementos muito detalhados ou datados. É simples, os elementos mais precisos desse universo (como aquele que nós encontramos os pais fundadores que escreveram a constituição americana) já tinham 200 anos!

Há ainda algumas refêrencias à cultura pop dos anos 1980.

Sim, há algumas piadas com Star Wars. Mas minha filha, que tem sete anos, gosta muito desse jogo, isso porque o jogo foi projetado anos antes de seu nascimento.

Você também fez sua filha jogar Grim Fandango, o qual o personagem principal é um esqueleto encarregado de fazer as almas passarem para o lado de lá? Ele não foi adaptado para as crianças…

De fato, há personagens que fumam. Bem, eu sei que é um pouco diferente na Europa, mas há igualmente passagens um pouco irreverentes.

É um jogo sobre a morte também!

Sim, mas nós falamos bastante da morte. Todo ano, há o dia dos mortos (festa tradicional mexicana, igualmente celebrada em algumas cidades dos Estados Unidos) em São Francisco, as pessoas falam bastante. É o que a gente gosta nesse jogo: as pessoas que parecem querer ter uma relação mais sã com a morte, que não é a grande ceifeira, esse ser aterrorizante que vem nos procurar e que você deve fugir a todo custo.

GrimFandango

O dia dos mortos é uma dia que nós nos lembramos das pessoas nós amávamos e que estão mortos. A morte é vista como o grande equalizador, ela não faz nenhuma distinção, nem de classe, nem de origem étnica. Essa festa é uma maneira muito boa de falar da morte para as crianças. Isso e o fato de ter animais. Principalmente peixes.

Quando Grim Fandango foi lançado em 1998, foi um jogo que fazia uso inovador de uma tecnologia ainda bem recente, o 3D. Hoje, você trabalha em um jogo em realidade virtual no universo de Psychonauts. Essa nova tecnologia mudará a forma como você trabalha?

Para esse jogo, nós partimos de um conceito totalmente novo, mesmo se a ação se situa no mundo de Psychonauts. Esse será um jogo um pouco mais próximo de um jogo de aventura, com quebra-cabeças. O herói, Raz, está em um local fixo, mas você pode controlar o ambiente pela pyrokinesia e telecinese. Sobretudo, Raz é clarividente, ele pode adotar o ponto de vista dos outros personagens. A tecnologia é mesmo legal: podemos criar ambientes complexos sem se preocupar com o risco de que o jogador vá se perder. A gente pode ter, por exemplo, árvores que não são bloqueadas pela visão da câmera!

Nós estamos ainda nos estágios iniciais. Quando Grim Fandango foi lançado, o 3D era quase uma técnologia mágica. A gente pode ser os objetos de dois lados! E se a gente mexer um pouco a câmera, a gente pode mesmo ver a parte de trás! Para enquanto, a realidade virtual tem um pouco o mesmo efeito, a gente diz: “Oh! nós dizemos mesmo que esse personagem me olha direto nos olhos!” É bem estanho. A gente se diz: ” eu não acredito que estou debaixo d’água! Eu não acredito que os objetos se movem ao meu redor! Não acredito que fiquei muito enjoado!”

Tem bons bons e outros nem tanto na realidade virtual como tecnologia, mas é uma coisa que dá mesmo vontade de utilizar. É preciso apenas tomar conta para ter no final um jogo que é divertido, com um roteiro de verdade, humor, e bons personagens, e não se contentar simplesmente de brincar com a novidade.

Parece que para criar os níveis de Psychonauts, que se baseiam nas fobias, você criou há alguns anos um documento o qual você registra todas as obssessões divertidas ou as fobias surpreendentes das pessoas que você encontra…

É verdade. Ao misturá-las, eu encontro idéias para novos níveis. Ao total, eu já tenho uns trinta. Se você procurar pelas patologias e psicologias na internet, você achará um monte de coisas – mas algumas dessas patologias são muito tristes para poder ser utilizadas em um jogo. A idéia é  sobretudo não tirar sarro de pessoas que têm problemas graves. Nossa abordagem é a de um desenho animado.

Há coisas nessa lista que você mesmo sente?

Com certeza – quando você se informa sobre essas patologias, você termina sentido alguma. Os transtorno obssessivos compulsivos, por exemplo: quando eu era pequeno, eu passava um tempo verificando se não tinha monstro dentro do armário do meu quarto…

Na faculdade, eu estudei a psicologia dos sonhos. Há muitas teorias sobre o sentido dos sonhos; eu fiquei marcado pelas teorias de Carl Jung, suas idéias sobre os arquétipos e sobre a inconsciência, a meneira como os arquétipos inconscientes passam pelo domnínio do consciente quando você está pronto. Quando você vira pai, por exemplo: os arquétipos da mãe e do pai passam pela sua consciência e tomam o poder. Eu realmente senti isso quando eu virei pai, como se um botão fosse apertado em alguma parte do meu cérebro. É uma coisa que será muito interessante em um nível de Psychonauts !

Os jogos ditos “point and click”, como Day of the Tentacle ou Monkey Island, eram muito populares nos anos 1990, e praticamente desapareceram no começo dos anos 2000. Como você explica isso?

DayTentacle

Ainda há muitos fãs desse tipo de jogo. Eles são mais numerosos que antes! Esses jogadores e jogadoras nunca desapareceram, o número deles simplesmente cresceu menos rápido do que os amantes de jogos de plataforma e de tiro. Quando Doom et Super Mario 3 foram lançados, eles fizeram um sucesso gigantesco, fizeram explodir o mercado de jogos de plataforma e de tiro.

No início dos anos 1990, uma boa parte das pessoas que jogavam video game era de entusiastas apaixonados da informática. Muitas crianças que jogavam “point and click” o faziam porque foram seus pais que compraram o jogo. Alguns anos mais tarde, as crianças jogavam principalmente Mario, os adolescentes jogavam Doom. Esses jogos venderam milhões de exemplares, e se você não vendesse tanto quanto, isso dava a impressão de que seus jogos foram fracassos, mas a comunidade de fãs não saiu do lugar, sempre tinha muitos amantes de jogos de aventura.

Haverá sempre gente que quer jogos com roteiros estudados, e os quais nós não corremos o risco de morrer se não reagirmos rapidamente. Eu mesmo sou muito lerdo! Eu gosto de tomar um tempo para pensar minhas ações, eu não sou bom nos jogos que precisam agir instintivamente, como os jogos de tiro. Eu prefiro concentrar minha cabeça em um quebra-cabeça, mas eu tenho a consciência de que não é o caso de todo mundo – muitos jogadores dão de cara com a parede nos “point and click”. E isso os deixa loucos. Mas em um bom jogo de aventura, as respostas terminam sempre por se apresentar a você. Se você continuar a fuçar, a falar com todo mundo, a tentar os objetos, você terminará por encontrar a solução.

Você experimentou muitas coisas em relação ao financiamento participativo. Isso permite desenvolver jogos mais originais?

A gente sempre pensa o mercado de video games como um mercado de massa, mas não é o caso! O mundo inteiro não está necessariamente procurando jogo de ação violento. O mundo está, ao contrário, à procura de uma variedade de experiências diferentes.
A questão é conseguir convencer as pessoas que acham que não gostam de video game. Frequentemente, a gente não diz a essas pessoas que tem outros tipos de jogos que podem lhes satisfazer, nem que podem ter outros tipos de jogos que não ainda não são produzidos.
Do outro lado do espectro, também tem gente que pensa sobretudo que não se deve mudar a maneira que os jogos são feitos. No ano passado, você provocou muitas reações quando você zombou do movimento ultraconservador GamerGate. Você recebeu ameaças?
Digo mais que eu recebi reações extremas de todos os tipos. E isso porque essa piada era de fato ingênua! Era mesma uma piada bastante inocente. O fato que nós podemos ter um olhar crítico, sobre o plano social, sobre os video games deixa brava muita gente que não quer os video games mudem. Eles não podem fazer nada, os jogos vão evoluir – mas os jogos que eles gostam continuarão a ser produzidos!

Simplesmente, esses jogos não serão mais exclusivamente “seus” jogos. Haverá outras pessoas no clube – eles querem ficar entre eles, impedir os outros de entrarem no clube, mas no fim das contas, todo mundo poderá entrar.

Damien Leloup
Journaliste au Monde

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