Entrevista traduzida com David Wise

Saudações aos leitores.

Segue após o link uma tradução de uma entrevista do site Gamikia com ninguém menos que David Wise, compositor de grandes trilhas sonoras para diversos games clássicos. Aproveitem.

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Se, um dia, eu tivesse a oportunidade de fazer um video game, e eu pudesse escolher um compositor para a trilha sonora, talvez ele(ou ela) não seria Hans Zimmer nem Harry Gregson-Williams. Grandes compositores, por sinal.

E não, não estou maluco…ainda. Mas eu escolheria alguém como David Wise. Ou possívelmente o David Wise em pessoa. A razão é que, na minha opinião, ele representa, como Koji Kondo, Grant Kirkhope ou Michiru Yamane, a música de jogos em sua forma pura. Independente de todas as modas, técnicas, recursos e estilos, quando você ouve sua música, você sabe que ela vem de um video game. De um grande video game, de fato.

David Wise entrou na Rare em 1985, sendo o único compositor até 1994, com a entrada de Robin Beanland, Graeme Norgate e Grant Kirkhope, formando o melhor time de compositores de uma companhia de games. Ele se despediu da Rare em 2009, alegando que não havia mais oportunidade para criar trilhas sonoras pelas quais a Rare felizmente era muito famosa.

Até então, ele trabalhou em uma longa lista de títulos, como a série Wizards & Warriors, Battletoads, Star Fox Adventures ou Diddy Kong Racing. Mas acima de tudo, ele sempre será lembrado por seu trabalho na trilogia Donkey Kong Country, lançado para o Super Nintendo.

Então…Oi David! Antes de tudo, deixe-nos mostrar nosso respeito perante uma verdadeira lenda na game music. É realmente uma honra.

Obrigado por suas palavras gentis e o seu interesse em meu trabalho como compositor de trilhas de video games. É sempre uma honra ser requisitado para uma entrevista.

Você era parte da Rare desde 1985, quase no começo da companhia. Como você se tornou um compositor de video games?

Me tornei compositor de video games quase por acidente. Eu estava trabalhando em uma loja de música, demonstrando um computador musical Yamaha CSX usando alguns dos meus próprios arranjos. Tim e Chris Stamper pediram uma demonstração de vendas, perguntaram quem havia escrito aqueles arranjos, e me ofereceram um trabalho na Rare.

É o estilo de vida que você imaginou quando era criança?

Eu queria ser compositor, então eu considero um privilégio compor músicas para video games.

Em Battletoads a música é puro rock, DKC tem uma sensação ambiente de jazz, a música de DKR é pop e cativante…seu trabalho é bastante variadp. Que tipo de música você gosta de ouvir?

Eu absolutamente escuto montes de diferentes estilos de música, constantemente. Orquestra, ópera, balé, rock, funk,pop, músicas infantis, trilhas de filmes, qualquer coisa que se conecta comigo emocionalmente.

Você normalmente toca algum instrumento?

Eu toco uma variedade de instrumentos: meu favorito é o saxofone e sou afortunado em ter um grande piano Bluthner no lounge. Toco violão, baixo, bateria e percussão, e no momento estou reapredendo a tocar trompete, que eu costumava tocar quando era criança.

A música de Donkey Kong Country ainda é aclamada por fãs e críticos, 15 anos depois. Essa série de jogos será inevitavelmente ligada a temas como Jungle Groove, Fear Factory ou Aquatic Ambiance. De onde veio essas melodias

Muito da inspiração veio da tentativa de superar as limitações de ter disponível apenas 64K de memória no SNES, e para fazer isso eu tinha que ser um pouco mais criativo na maneira que usava os dados de ondas sonoras disponíveis.

Em muitos jogos da Rare, era comum ver vários compositores creditados. Você era incluído ao lado de Graeme Norgate em Donkey Kong Land, em DKC com Robin Beanland e Eveline Fischer. Como era distribuído o trabalho entre os compositores?

Afortunadamente Graham, Robin e Eveline são compositores talentosos e tecnicamente competentes. Executar as melodias no SNES ou no GameBoy era um processo que consumia um certo tempo, então era mais o caso de quem estava disponível para escrever a próxima melodia requerida.

Onde em dia, as músicas dos jogos best sellers são gravadas com orquestra, arranjos orquestrados…são ótimas, mas as vezes os jogadores se lembram mais de um tema em midi gravado vinte anos atrás com menos recursos do que o arranjo sinfônico mais atual. Você acha que isso se deve a nostalgia, ou existe alguma coisa coisa?

Nós não tínhamos nem mesmo o luxo do midi, tudo era escrito em código Hex até o Nintendo 64.Os chips sonoros eram muito mais limitados do que os recursos disponíveis atualmente, então a música era muito mais proeminente nos jogos.

Talvez porque a música agora tenha que competir com efeitos sonoros, falas e sons ambientais, não tenha a atenção que merece.

Stickerbrush Symphony, Aquatic Ambiance, Spaceport Alpha, Forest interlude, Turbo Tunnel Race em Battletoads… todo mundo tem seu tema favorito. Mas qual é a música de que você se orgulha mais? Por quê?

Eu considero Aquatic Ambience foi o ponto da virada. Era tecnicamente trabalhoso de emular a técnica da “sequência de ondas” do Korg Wavestation para contornar o limite de 64k do SNES. Aquatic Ambience levou 5 semanas de programação, re-programação e para funcionar, mas os resultados defintivamente valeram a experimentação.

Nos anos noventa, a Nintendo e a Rare pareciam competir para ver quem fazia os melhores jogos no SNES e Nintendo 64, como Mario Kart e Diddy Kong Racing, Banjo Kazooie e Mario 64 ou Donkey Kong Country e Super Mario World. Você sentiu essa rivalidade saudável nas músicas?

A Nintendo escreveu grandes temas musicais, afinal todos conhecem o tema do Mario, é simplesmente icônica, assim como os temas para Zelda, Star Fox e incontáveis outros video games da Nintendo.

Então sim, havia definitivamente uma rivalidade saudável. Por exemplo: com a trilha para Diddy Kong Racing eu queria fazer que fosse mais Mario Kart do que o próprio Mario Kart. Os jogos da Nintendo e seus estilos são grandes fontes de inspiração.

A saída da Rare da Nintendo foi traumática para a companhia japonesa, para os fãs e para a Rare também. Desde então, você está apenas trabalhando em alguns poucos títulos relacionados a franquias ou consoles da Nintendo. Eu não sei o que aconteceu nessa indústria quando um grande compositor como você teve de deixar uma companhia para qual trabalhava tanto tempo. Mas você começou de novo com o David Wise Sound Studio. Você tem projetos para continuar a fazer jogos para video games?

Sou muito afortunado por trabalhar com alguns projetos muito inspiradores de video games no momento, com alguns produtores muito telentosos. Tempos muito excitantes, e estou ancioso para que esses projetos dêem seus frutos.

Seu recente remix do tema da tela de créditos de DK2, “Re-Skewed”, é realmente impressionante.

O remix “Re-Skewed” foi afortunado o suficiente de se beneficiar dos incríveis talentos de Robin Beanland e seu “flumpet”(intrumento híbrido entre trompete e fliscorne) e Grant Kirhope na guitarra principal.

Foi feita para ser a perfeita música de despedida para minha carreira na Rare.

Dessa maneira (computador + intrumentos reais) serão suas músicas de seus novos projetos, ou você tem em mente, como Grant Kirkhope fez em Viva Piñata, que escreveu uma trilha orquestrada?

Caso um projeto suporte uma trilha orquestrada completa, e onde o orçamento estiver disponível, então sou bastante favorável a seguir esse caminho.

Também acredito que a trilha tenha que ser harmônica em relação ao ambiente do jogo também. Uma trilha que eu trabalhei no ano passado era bastante atmosférica, e eu preferi um uso mais esotérico da instrumentação.

Eu sempre prefiro a performance e a entrega do uso de instrumentos reais quando for possível, pois nada pode se comparar. Entretanto, as vezes eu faço de outro jeito usando controladores midi para tocar samples ou instrumentos VST, tanto de um kit de bateria midi ou de um controlador de sopro Akai EWI.

Eu também uso vários microfones ajustados para gravar a colecão de instrumentos que eu tenho em mãos no meu estúdio.

Em tempos recentes, nós temos visto muitos concertos sobre música de jogos ao redor do mundo, Videogames Live, Castlevania Concert, Play!, Zelda Symphony… Assim como o time musical da Rare (Beanland, Kirkhope,Norgate, você mesmo…) foi um dos melhores dentro dentro de qualquer companha de games, e muitos de vocês ainda estão na ativa, houve algum plano para fazer um concerto com música que a Rare fez naqueles dias? Você gostaria de fazer?

Ano passado Thomas Boecker me convidou para acompanhar a Symphonic Legends que apresentada pela orquestra filarmônica de Estocolmo.

Eles tocaram uma versão de “Aquatic Ambiance” de Donkey Kong Country, que foi arranjada pelo senhor Masahi Hamauzu e também com o pianista muito talentoso senhor Benyamin Nuss. Esse era um tema de temas famosos da Nintendo e arranjado e conduzido pelo incrivelmente carismático Arnie Roth.

Eu estive em muitos concertos orquestrados em minha vida e posso dizer honestamente, eu nunca experimentei nada tão poderoso e energético quanto as performances que eles entregaram, foi muito inspirador.

Eu nunca ouvi sobre planos similares a respeito de concertos exclusivos para os concertos com video games da Rare, mas certamente é válido para consideração.

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Em uma entrevista anterior, Grant Kirkhope também nos disse qual foi sua música de despedida na Rare. É Bedtime Story, tema de Viva Piñata, tão bonita e triste, refletindo a nostagia dos anos de ouro, que definitivamente ficaram para trás. David Wise, fez o mesmo com Re-Skewed, mas é uma música muito mais otimista, que parece enfatizar não no fato de que infelizmente o tempo dele na companhia tristemente terminou, mas que felizmente, uma vez, havia mágica. Eu concordo com ambos.

5 thoughts on “Entrevista traduzida com David Wise

  1. “Nos anos noventa, a Nintendo e a Rare pareciam competir para ver quem fazia os melhores jogos no SNES e Nintendo 64” Deu até um arrepio de ler essa frase, o tempo bom que não volta mais.
    Excelente post, interessante saber como funcionava a musica de antigamente, uma que não sai da minha cabeça é o tema do Spark Mandrill do Megaman X, outro sucesso a parte.

  2. Talento versus limitação técnica, parece que essa combinação ajudou muito na produção de pérolas dos games como DK, sempre se buscava tornar o melhor possível seja em áudio ou em gráficos, com isso eles estraiam o máximo e muitas vezes iam além do que o próprio console podia oferecer para dar o melhor produto aos gamers. Hoje em dia temos o contrário poder gráfico e sonoro sem talentosos compositores, salvo algumas excessões.

  3. @George Sadat, acho que o problema não é nem a falta de talento não. Acontece que a indústria de games cada vez perde identidade, com essa maldita mania de copiar o cinema (veja bem, games arrecadam bem mais que o cinema e a indústria fonográfica, e mesmo assim produtores querem transformar jogos em filmes, lineares e cheios de pseudo-roteiros “bem produzidos”), e as músicas simplesmente sofreram com o processo.

  4. Hoje em dia usa-se muito mais a trilha sonora só para dar o clima, em vez de dar algo melodioso que grude em nossas cabeças. Isso é principalmente verdade nos jogos ocidentais.
    Eu lembro de vezes em que a música de um jogo aparecia em minha cabeça ou em um sonho e me dava vontade de jogar tal jogo.
    Ah, Street Fighter 2, Final Fantasy 7, Shining Force 2, The King of Fighters 94-99, são só uns pouquíssimos exemplos de jogos com músicas que grudaram em minha cabeça. Tantos são outros, que é até injustiça listar alguns.
    E as músicas do NES tem algo de muito especial sim, é até impressionante.

  5. Pois é, acho que é verdade o que David disse, que hoje em dia, as músicas e trilhas tem de disputar com gráficos e sons ambientes cada vez mais realistas.
    Esses elementos deveriam andar juntos, e não competir entre si. No caso de DK, todo o arranjo parece se encaixar como uma luva nas cores, animações e na forma como o jogo fluía. Acredito que as OST’s de hoje, precisam de mais personalidade e criatividade – deixar as fórmulas engessadas e mais lucrativas de lado – pra que som e imagem pintem o mesmo desenho.
    Poucas são as exceções que superam expectativas…

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