Mais uma tentativa de pânico moral fracassa (embora eles ainda não desistam)

Saudações aos seres baseados no carbono.

Apesar dos aparelhos de videogame fazerem parte da sociedade por mais de trinta anos, é incrível e ao mesmo tempo triste como eles ainda são combatidos e mal compreendidos. Falarei no texto de hoje de mais uma patética tentativa de satanização dessas malvadas máquinas que levam nossos inocentes jovens ao caminho da perdição. Até breve.

Pois é amiguinhos, eles não desistem. Eles quem, vocês me perguntam. Aqueles conservadores e puritanos de sempre que insistem em tentar provar que os videogames são a maior ameaça ao futuro da humanidade, logo ao lado do aquecimento global. Comento no texto de hoje mais uma batalha quixotesca da cruzada anti-videogames, em que mostrarei o fracasso de mais uma pesquisa mambembe e os porquês de sua derrocada.

Irei direto ao ponto. A patifaria da vez veio direto da Utah’s Brigham Young University, cuja pesquisa foi publicada pela Journal of Youth and Adolescence. Conduzida por uma equipe de quatro professores (o resumo em inglês se encontra aqui), tinha por objetivo clarear o entendimento do padrão de uso da internet e dos videogames pelos estudantes universitários e examinar como o lazer eletrônico está relacionado com comportamentos de risco (como uso de drogas, álcool e sexo), além dos relacionamentos sociais. Infelizmente não pude ter contato com a versão integral, pois seu acesso é pago, mas mesmo assim o resumo já dá uma idéia clara do que eles pretendiam.

A principio estava tudo ok, foram entrevistados 813 universitários em processo de graduação, dois quais 500 mulheres e 313 homens “jovens”, definição que eles usaram para a faixa dos vinte anos. Porém, daí tudo vai ladeira abaixo com conclusões geniais:

Quanto mais os estudantes jogam videogames, pior seus relacionamentos são com amigos e pais (embora esse efeito seja modesto)

Aqueles que jogam videogame diariamente fumam duas vezes mais maconha que outros jogadores e três vezes mais do que aqueles que nunca jogam.

Mulheres “jovens” que jogam costumam ter baixa auto-estima.

Muita calma nessa hora. Parem, respirem, se preferirem, levantem da cadeira, dêem uma voltinha e retornem ao computador. Vocês não leram errado. Depois de ser uma máquina alienadora e criadora de assassinos, agora os videogames se tornaram uma plataforma criadora de drogados, melhor ainda, de maconheiros. Mas não é só isso, amiguinhos, pois há mais, sempre há mais. Vejam o que disse Laura Walker, autora-chefe do estudo:

Tudo o que encontramos associado aos videogames se mostrou negativo… (mas) eu não quero que os pais saiam por aí proibindo todos os videogames. É como a TV. Nós temos que escolher o que é bom e o que é ruim e praticar com moderação

Sério, Dra.Walker, que a senhora gastou tempo e dinheiro para nos dizer que devemos definir o que é bom e ruim e praticar com moderação? A minha falecida avó já dizia isso como medida para qualquer coisa na vida, sem contudo precisar fazer uma pesquisa universitária. Incrível também foi a falta de coragem da doutora com esse patético “bate-assopra”, sobre isso eu discorrerei mais para frente no texto.

O que eles chamam de pesquisa não passa do velho e infame pânico moral, o qual os videogames já passaram diversas vezes nos últimos anos. A fórmula é conhecida: parte-se de uma tese viciada (ou seja, cuja conclusão já é conhecida antes mesmo de qualquer trabalho por parte de seus idealizadores), produz-se algum “estudo” ou “trabalho” cujos argumentos são colados com cuspe, em que tcharãam… é dito o que o que se queria ouvir desde o início. Ainda não foi o caso desta vez, mas a seqüência óbvia é aquele esquema também já manjado com a mídia tradicional (canais de TV aberta de sempre) dando a sua cobertura sensacionalista e superficial, com seus apresentadores “indignados” e “defensores da familia”. Vocês sabem como funciona o circo e como atuam seus palhaços.

Para demonstrar como esse esquema de pesquisa capenga/mídia sensacionalista funciona, cito um trecho de um artigo do doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC, Sérgio Nesteriuk, publicado no livro Mapa do Jogo:

“A abordagem apocalíptica em relação ao meio é mais difundida e alega que, ao banalizar a violência, o videogame estimula comportamentos agressivos entre seus jogadores. Tais afirmações são normalmente amparadas em testes e experimentos do tipo quantitativas, e em comparações entre o comportamento social de pessoas – principalmente crianças e jovens – que jogam com as que não jogam videogame. A solução estaria em restringir ou mesmo impedir o uso de videogames, sobretudo pelas crianças. Existe normalmente por trás dessa visão uma idéia limitada e limitadora de que “o meio é mensagem”, isto é, que a essência do videogame é, por natureza, banal, nociva e prejudicial; a pessoa deveria aproveitar melhor o seu tempo realizando outras atividades, como ler um livro, conversar com outras pessoas, praticar esportes ou estudar”

Não foi por nada que negritei esse trecho dentro da declaração. Voltem para o começo do texto e releiam as conclusões da pesquisa e a frase da Dra. Laura Walker. Percebam a relação direta que há entre o que Nesteriuk apontou com a tese furada de Utah.

E as cabeças batem

No meu modo de ver, quando se produz uma opinião sobre qualquer que seja o assunto, o mínimo que se espera do opinante é que ele/ela sustente aquilo que disse/escreveu/publicou. Uma prova extra de que essa pesquisa não tem nada de muito sério, é que nem seus realizadores não têm coragem de assumir o que eles mesmos publicaram e disseram. Pouco tempo depois que saiu a noticia no Game Politcs e em outros sites, os pesquisadores correram para se justificar, recuando imediatamente daquilo que está lá publicado na peça. Pior que isso, foi a saia justa em que o Dr. Larry Nelson colocou a sua chefe de pesquisa:

“O estudo não concluiu absolutamente que videogames causam esse comportamento. Nós temos repetidamente tentado enfatizar isso no estudo em si. Era tudo correlação…Um fator (do aumento de uso de substâncias) poderia ser a experimentação que vai com (drogas e álcool)… Se nós tivéssemos feito um estudo especificamente sobre os videogames… Eu tenho certeza que (os benefícios) estariam lá. Não há dúvida de que eles estão lá. Nós não estamos dizendo que não há nada de positivo sobre videogames.

O que começa como uma justificativa desesperada termina de modo sensacional. A Dra. Walker foi absolutamente enfática quando afirmou que “tudo o que encontramos associado aos videogames se mostrou negativo”, e na primeira “apertada” o Dr. Larry bate cabeça justamente com sua chefe. Mas ainda há mais emoção, caro leitor, com o sensacional “spin” da Dra. Walker, um quase duplo twist carpado:

“Um estudo não reinvidica ser representativo de todos dos jogadores, e não estamos de forma nenhuma fazendo essa afirmação. Nós não estamos nem generalizando o grupo da faixa dos 18-25 anos, isso é apenas o que encontramos na nossa amostra.A mídia de um modo nem sempre preciso distorce essas histórias. Entretanto, no nosso estudo, nós encontramos que o uso de videogames estava relacionado apenas a comportamentos negativos para estudantes dessa idade. Isso significa que se aplica a todos os jogadores? Não. Significa que videogame causa esses resultados? Certamente não. É possível que o uso de videogame possa ser positivo de várias formas, mas dada as variáveis que medimos em nosso estudo, eram relacionadas apenas a resultados negativos…”

Uma ova, Dra. Walker! Se teve alguém que deu uma verdadeira aula de contorcionismo foi você. Além de ficar em um lenga-lenga que saiu no nada para o lugar algum, você conseguiu ao mesmo tempo se contradizer e contradizer as conclusões do estudo que você própria chefiou. Se na conclusão do estudo é afirmado de forma imperativa que aqueles que jogam videogame diariamente fumam duas vezes mais maconha que outros jogadores e três vezes mais do que aqueles que nunca jogam; e mulheres jovens que jogam costumam ter baixa auto-estima, como é que agora vem com esse papinho de que não se aplica a todos e que não é o videogame quem causa isso? Não acho bonito tratar as pessoas como idiotas. Mesmo porque, se você fosse tão inteligente assim, não teria produzido uma peça acadêmica tão ruim.

No fim das contas, esse tipo de “pesquisa” segue um esquema manjado que pode ser facilmente manipulado de acordo com a conveniência que for. Darei um exemplo rápido aqui de como essa tentativa de método é furada. Sigamos: vamos supor que eu queira provar que o hábito de tomar banho diariamente leve os jovens a criminalidade. Aí eu seleciono quinhentos infratores menores de idade, ignoro seus perfis psicológicos, sociológicos, bem como seus históricos familiares. Crio um questionário com perguntas genéricas acerca de seus hábitos básicos. Ao levantar as questões, percebo que 450 dos 500 infratores tomam banho diariamente. Conclusão? Tomar banho leva ao crime. Parece absurdo, mas nesse esquema mequetrefe eu posso provar o que for, até que comer arroz com bife e bata frita tem mais chance de levar alguém à criminalidade, do que sei lá, chupar bala Sete Belo de maçã verde.

Uma porcaria total. Constrangedor de tão ruim. Diversas perguntas-chave que poderiam ser relevantes foram ignoradas, como por exemplo: se esses estudantes jogavam videogame antes de entrarem na faculdade? Por quanto tempo? Eles fumavam maconha antes ou depois do ensino superior? Usam outras drogas? Fumavam antes ou depois de começar a jogar videogames? Eles têm problemas de relacionamento desde quando? A droga foi um catalizador desse processo? Eles jogam videogame sozinhos ou em grupo? Qual é o gasto mensal desses estudantes com jogos, consoles e acessórios? Quanto tempo eles dedicam e/ou dedicaram a esse hobby? Enfim, eu poderia gastar mais dezenas de linhas com perguntinhas incômodas que só terminariam como lacunas do grande queijo suíço que é o trabalho da Dra. Walker e seus pares. Se era para ser uma peça de humor, acho que os Trapalhões fariam melhor.

Por hoje é só, amiguinhos. Parabéns aos sobreviventes que se deram ao trabalho de ler o texto todo, tentei ao máximo ser objetivo, mas não teve como o texto não ficar grande. Abraços e até o próximo post.

André V.C Franco/AvcF – Loading Time.

15 thoughts on “Mais uma tentativa de pânico moral fracassa (embora eles ainda não desistam)

  1. Isso me lembrou aquela pesquisa do pão, hehehe… (98% dos criminosos comem pão / 50% das crianças que crescem comendo pão apresentam desempenho escolar abaixo da media / mais de 90% dos crimes violentos são cometidos no intervalo de 24 horas após o assassino ingerir pão…)

  2. Cara!!!!!!! Se fosse para dizer uma coisa e logo depois desmintir era melhor nem fazer isso!!! Como Jô Soares diria: Essa é mais uma obra de cientistas desocupados!!!!!! Ahh, ainda bem que o Blog voltou, já estava sem nada para fazer na net. Abraços

  3. tava viajando,entao nao postei antes ~~

    tipo
    marijuana ou a “tia mary” combatem o cancer entao nao pode ser ruim fumar marijuana e jogar
    sao 2 coisas legais XD

    zuera

    eu jogo vg desde os 6,hoje tenho 18,e jogo futebol americano, sai pra fazer um monte de coisas e nunca tive problemas de relacionamente com as pessoas!

  4. pior mesmo e meu pai dizer q tomar red bull te deixa doido
    esses dias ele tomou a “copia” burn
    e gostou e nem acho ruim quando falei q era a mesma coisa

    ~~
    mas sacanagem e ele nao tomar kuat pq leu a 3,sim 3 anos atras… que dava cancer,quando ele ia tomar eu falei isso e ele tomou coca-cola q ele tanto odeia!!!

  5. Seria engrçado se tivesse proibido o videogame porque fosse considerado como droga.

    Hoje estaríamos todos correndo na boca mais próxima, ou até fazendo download de conteudo entorpecente na XDrug Live.

    Até imagino o diálogo num “Cidade de Deus” qualquer:

    – Ow cumpadi Me ve 10 conto de Mario Bros.

    – Rapá….tu tá de brincadeira? O lance do verão agora é tomar Gears of War na veia!

  6. Para qualquer merda ganhar visibilidade, basta colocar antes “Cientistas da (coloque o nome da faculdade aqui), chegaram a conclusão”, depois disso, mesmo se vier: “chegaram a conclusão, depois de um trabalho de pesquisa, que o oxigênio é o principal causador de todas as desgraças do mundo, já que as pessoas que fizeram qualquer coisa ruim, em qualquer lugar do mundo, consumiram oxigênio antes da sua ação”, algum débil vai acreditar nisso. É revoltante, acho que isso só vai mudar quando essa geração de puritanos burros estiver bem enterrada.

  7. Maconha é uma planta. o que pode ser considerado droga é um baseado de maconha, mas ainda assim para esse mesmo código penal é tão grave e criminoso quanto estacionar em local proibido.

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